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Haiti volta à pauta mundial após surto de cólera

[Haiti volta à pauta mundial após surto de cólera]
Depois do violento terremoto que destruiu o país em janeiro desse ano, o Haiti é assolado agora por um surto de cólera que já matou mais de 250 pessoas e infectou outras três mil. O diretor geral do Departamento da Saúde do Haiti, Gabriel Thimote, afirmou no último domingo, no entanto, que foi registrada uma diminuição no número de mortes e de pessoas hospitalizadas nas áreas mais críticas.

Cerca de 1 milhão de sobreviventes do terremoto estão vivendo em barracas próximas à capital, sem saneamento básico e com acesso limitado a água potável. Acredita-se que o surto de cólera tenha sido provocado pelo consumo de água contaminada do rio Artibonite. As localidades mais atingidas são Douin, Marchand Dessalines e arredores de Saint-Marc, a cerca de 100km de Porto Príncipe. Mas, vários casos foram registrados na cidade de Gonaives e em vilarejos próximos à capital, entre eles Archaei, Limbe e Mirebalais.

Centros especiais para o tratamento de cólera foram montados nas áreas com maior número de casos e na capital. De acordo com o governo, o país possui antibióticos suficientes para tratar até 100 mil pacientes.
 
Ocupação militar brasileira
 
Desde 2004, o Brasil comanda e integra a Minustah (Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti) num quadro claro de ocupação militar, atitude imperialista e contrário à auto-determinação do povo daquele país. Com a justificativa de promover a estabilização, a missão converteu-se em presença opressora e reúne uma série de denúncias de violência contra civis haitianos.

Diversos movimentos sociais brasileiros e o PSOL defendem a retirada imediata das tropas brasileiras no Haiti, pois acreditam que elas não garantem a pacificação e cumprem o papel de impedir as manifestações e revoltas populares. As mulheres são as principais vítimas, perseguidas e violentadas pelas tropas de ocupação.

Ao invés de policiamento, o Brasil poderia se empenhar em dar ao Haiti apoio técnico, para sua agricultura, médicos para sua população, além da implantação de projetos sociais de saúde, saneamento, educação e pleno emprego, que estimulem em curto prazo sua emancipação.

Nesse sentido, o Ministério das Relações Exteriores brasileiro anunciou no dia 25 de outubro que irá enviar US$ 2 milhões (cerca de R$ 3,4 milhões) para auxílio à população e ao governo do Haiti no combate ao surto de cólera. O Ministério da Saúde deverá enviar, ainda nesta semana, dois médicos epidemiologistas que ajudarão as autoridades sanitárias locais na montagem da estratégia de combate à doença. O órgão também estuda também o envio de recursos autorizados por crédito extraordinário para a ação no Haiti.
 
Eleições
 
O candidato à Presidência do Haiti Leslie Voltaire pediu no dia 25 de outubro o adiamento das eleições gerais do país, caso a epidemia de cólera continue.

?Acho que se a epidemia se prolongar, teremos de adiar as eleições em meu país porque é melhor salvar vidas que fazer eleições?, argumentou o político, momentos após uma reunião em Santo Domingo.

Voltaire qualificou de ?grave? a situação apresentada nos últimos dias no Haiti, mas se mostrou ?confiante? em que as autoridades sanitárias de seu país, junto às da OMS (Organização Mundial da Saúde), possam conter a propagação do mal.

?As eleições devem ser realizadas, mas, para nós, o mais importante é que o povo continue vivendo. Faremos as eleições quando as condições o permitirem?, afirmou o candidato à sucessão do presidente haitiano, René Préval.
 
 
Com informações da BBC Brasil e Folha de S. Paulo
 
 
Veja abaixo texto escrito pela Secretaria de Relações Internacionais do PSOL após o terremoto de 12 janeiro 2010:
 
Haiti nos chama: solidariedade incondicional e respeito à soberania do país
 
Por Secretaria de Relações Internacionais do PSOL

No Haiti a terra sacudiu-se contra um povo digno. Chamamos todos os governos e organizações a reagir com a mesma força do terrível terremoto. É isso o que merece o povo haitiano. É preciso tecer uma autêntica solidariedade internacional em defesa deste povo, que marcou a história do nosso continente com a coragem da luta por justiça social. Um povo que, se hoje é o mais pobre da América Latina, é porque foi subjugado, levado à miséria pela espoliação sistemática de potências imperialistas. Como nunca, a solidariedade mundial com os haitianos é necessária: urge criar condições para uma reparação histórica das violências cometidas contra o país.

Imperialismo e catástrofe permanente

O Haiti viveu processos extremos ao longo de sua história. Foi o país mais rico da América Latina colonial, entre os primeiros exportadores de açúcar do mundo no século XVIII. Mas a riqueza da terra se converteu em pobreza dos homens. Os escravos africanos trabalhavam como animais para adoçar os cafés e chás europeus. Em 1792, o Haiti foi palco da primeira revolução social escrava do planeta. Foi o Haiti o principal responsável por forçar a França a abolir a escravidão em seu império. Os haitianos revolucionários de 1792 colocaram até jacobinos franceses contra a parede, e foram, por isso, nomeados de ?jacobinos negros?. Constituiu-se uma corajosa e inédita ?República Negra?. Em 1802, Napoleão decretou a volta do sistema escravista em suas colônias do sul. O Haiti se revoltou novamente, e em 1804 seu povo con quistou a independência política nacional. Foi o primeiro país latino americano que se emancipou (formal e parcialmente) do jugo europeu. Dessa vez, constituiu um Império.

As elites latino-americanas atravessaram o século XIX sob o fantasma da revolução escrava no Haiti. Já o Haiti atravessou o século XIX sendo assediado pelos norte americanos, que empossaram e golpearam governantes como se o país fosse um brinquedo. Depois da invasão de marines em 1888, o mais longo período de intervenção ianque durou quase 30 anos (1915-1934). De 1957 a 1986, o país foi subordinado à ditadura dos Duvalier (Papa Doc e seu filho, Baby Doc). Comandantes de tropas paramilitares aterrorizantes chamadas tonton macoutes, os Duvalier aprofundaram o quadro de miséria e violência, e submeteram o país a uma ditadura marcada por assassinatos e desaparecimentos de mais de 30 mil pessoas. Além disso, foram autores do crescimento astronômico da dívida pública do Estado haitiano, amarrando qua lquer possibilidade de soberania.

Após sucessivas juntas militares provisórias de governo, Jean-Bertrand Aristide se tornou presidente em 1990. Porém foi golpeado por militares no ano seguinte. Após mais uma sucessão de golpes e contragolpes, Aristide voltou ao poder em 2001. Porém, uma onda de protestos aproveitada pelo imperialismo de Estados Unidos e França, o golpeou novamente em 2004. Desde então, há uma ocupação militar de tropas estrangeiras no país, sob o rótulo enganador de ?estabilização política?.

O saldo negativo de 5 anos da ?ação humanitária?no Haiti: só as multinacionais agradecem

Hoje, o Haiti possui 9 milhões de habitantes, 95% negros. 47% da população maior de 15 anos é analfabeta. Com o PIB per capita mais baixo da América Latina, o Haiti só supera alguns países da África e o Nepal. Dos 7 bilhões de dólares do PIB, 40% corresponde ao envio de remessas por haitianos que vivem no exterior, sobretudo Miami e Nova York.

A distribuição de renda é também das mais desequilibradas do mundo: os 10% mais pobres obtém 0,7% da renda nacional, enquanto os 10% mais ricos obtém 47,7% da renda. Com isso, 80% da população sobrevivem abaixo da linha de pobreza, ou seja, com menos de 1 dólar diário. 75% das casas não possuem saneamento básico, mais de 60% da população não tem acesso à água potável e não há serviço de coleta de lixo. O desemprego atinge 80% da população, e o salário médio não chega a 50 dólares mensais. A taxa de mortalidade infantil é a mais alta da América Latina e somente 24% dos partos recebem atendimento médico. A expectativa de vida é de 49 anos.

Desde 2004, o Brasil possui um contingente militar no país, e lidera uma operação da ONU. Depois de 5 anos de suposta ?ajuda humanitária? da Missão das Nações Unidas para Estabilização Política do Haiti (Minustah), a situação do país permanece desumanamente inalterada. As tropas azuis da ONU reprimiram duramente protestos populares, violentaram as rebeliões civis, e não produziram ações sociais e políticas capazes de redistribuir a renda e criar condições de educação e saúde no país. A prometida ?estabilidade política?, ao que parece, teve uma única e exclusiva função: garantir a presença das multinacionais no país e criar novos fluxos de capital. Além de servir como cruel laboratório do exército brasileiro: um campo vivo de treinamento militar permanente disfarçado de ?a ção pacificadora?.

O terremoto do dia 12: converter investimento militar em investimento social e humanitário

Nesse momento, com a tragédia sem precedentes do terremoto do dia 12, urge transformar todo contingente militar da ONU em efetiva ajuda humanitária ao país. Não são necessárias armas! Violentar o povo que saqueia supermercados não é a melhor maneira de ajudar. Também não ajuda em nada ?proteger os estabelecimentos comerciais? contra uma população desprotegida, faminta e pobre. É urgente enviar alimentos, água potável, roupas, remédios, e outros produtos de necessidade básica inclusive por pára-quedas. A dificuldade de se chegar ao local é um dos principais obstáculos. A situação de caos e desamparo é extrema. O povo de Porto Príncipe dorme nas ruas, com medo de novos tremores. A estimativa do presidente René Préval é de cerca de 50 mil mortos. Muitas pessoas ainda estão sob escombros e há u ma quantidade indefinida de feridos.

É preciso que todo o investimento bélico brasileiro no Haiti seja imediatamente convertido em investimento social e humanitário. Essa é hoje a principal exigência que todos devemos fazer ao governo brasileiro. A ajuda internacional arrecadada até hoje corresponde a míseros 3% do PIB do Haiti. Os 500 milhões de dólares doados ao povo haitiano pelo mundo, incluindo doações civis, nem se comparam aos mais de 10 trilhões de dólares que escoaram das reservas do Governo dos EUA para salvar Wall Street da crise econômica. Exigimos que essa ajuda seja multiplicada. Que todos os países e organizações financeiras internacionais credores do Haiti anulem imediatamente as dívidas do país.

As organizações populares brasileiras, movimentos sociais, sindicatos, ONG?s também tem o dever de articular campanhas de emergência em solidariedade ao povo haitiano. O PSOL se compromete a ser solidário e ativo com todas as medidas que se tomem nesse sentido.
 
 
 
*Foto de Thony Belizaire / AFP - Ponto de distribuição de água potável em Porto Principe
Fonte: www.psol50.org.br
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