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Ivan Valente critica urgência na votação do Código Florestal no plenário da Câmara

[Ivan Valente critica urgência na votação do Código Florestal no plenário da Câmara]

Em pronunciamento feito na Tribuna da Câmara nesta terça-feira (7), o deputado federal Ivan Valente, líder do PSOL, manifestou preocupação com as negociações da Convenção sobre Mudanças Climáticas (COP-16), que acontece esta semana em Cancun

?As perspectivas de Cancun aprovar um acordo legalmente vinculante, que obrigue as nações a cumprir metas, são pequenas. Neste caso, seguirá valendo o Acordo de Copenhague, cujos compromissos voluntários dos países levariam a um aumento da temperatura do planeta de em média 3 a 4 graus, criando um cenário de catástrofe para milhões de pessoas?, avaliou.
 
Ivan Valente também apontou a contradição entre os compromissos de redução da emissão de gases de efeito estufa, assumidos internacionalmente pelo Brasil na Conferência de Copenhague  (COP-15), com a urgência apontada por alguns parlamentares em votar o novo texto do Código Florestal na Câmara, aprovado em julho na Comissão Especial.
 
?Nesta Casa se conspira, se articula duramente para traçar o caminho contrário ao que defendemos lá em Copenhague, ao que devia ser a vocação do Brasil com seus biomas?, disse Ivan Valente. ?Aprovar o relatório Aldo Rebelo sobre o Código Florestal, que é um desastre para a biodiversidade brasileira, é a ratificação de uma política agrícola e agrária nociva para o nosso País; é o interesse de corporações acima dos interesses nacionais e dos interesses difusos. Por isso, o PSOL manifesta nossa radical discordância com a votação desta matéria e exige que a Presidente da República cumpra sua palavra de não votá-la?, disse o deputado.
 
Leia abaixo a íntegra do pronunciamento:
 
A urgência do sucesso nas negociações da COP-16
 
Senhor Presidente, senhoras e senhores Deputados,
 
Esta semana começou, em Cancun (México), o chamado ?segmento de alto nível?, do qual participam ministros e chefes de Estado, da 16ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP-16). Apesar de ser um espaço fundamental para o avanço de acordos visando a proteção do meio ambiente, a COP-16 corre o risco de repetir o fracasso da COP-15, ocorrida no ano passado em Copenhague, na Dinamarca. Isso porque há um choque de agendas e prioridades entre o ideal e o possível no seio da Convenção de Mudanças Climáticas.
 
A agenda ideal inclui uma distribuição equitativa do uso da atmosfera e dos custos para a sua recuperação. Defende que os países desenvolvidos baixem suas emissões de gazes do efeito estufa e comecem a retirar da atmosfera, através do reflorestamento, o que emitiram de CO2 historicamente. Enquanto isso, os países em desenvolvimento devem reduzir rapidamente suas emissões. Para isso, os países desenvolvidos devem transferir grandes quantias aos países em desenvolvimento como forma de compensação pelos danos causados ou por causar com os efeitos das mudanças climáticas por eles provocadas.
 
A agenda do possível, no entanto, vai em sentido oposto, de acordo com a vontade dos mais ricos e dos mais fortes ? os mesmos que historicamente foram os grandes responsáveis pelo aquecimento global do planeta. De 1971 a 2006, segundo o IPCC, os Estados Unidos mantiveram o posto de maior emissor histórico de CO2. Hoje, a concentração de CO2 na atmosfera está ao redor de 386 ppm, isto é, de cada milhão de outras partículas, 386 são de CO2. Antes da revolução industrial estava ao redor de 288 ppm. Resultado, a temperatura média da Terra, que era de 14,5ºC, hoje já passa de 15ºC. Parece pouco, mas já é suficiente para causar as tragédias ambientais que temos assistido.
 
Apesar disso, Senhor Presidente, não parece haver vontade política por parte dos países desenvolvidos para reduzir seus padrões de produção e consumo e, assim, diminuírem ou zerarem suas emissões. Um dos objetivos de Cancun seria inclusive aprovar a continuidade do Protocolo de Kioto, que estabelece limites para as emissões das nações mais ricas até 2012 e que, portanto, está prestes a perder sua validade. A reunião de Cancun será substituída em 2011 pela 17ª Cúpula, a apenas um ano do prazo de expiração do Protocolo. O documento, aprovado em 1997, dizia que os países deveriam reduzir suas emissões a 5,2% dos níveis de 1990. Os EUA não ratificaram o Protocolo de Kioto e a China, hoje segunda maior emissora, não tem obrigação de reduzir suas emissões porque é considerada um país em desenvolvimento.
 
O Japão já declarou em Cancun que não vai apoiar a proposta de estender o Protocolo para além de 2012. Austrália, Rússia e Canadá podem seguir a mesma linha. Os países ricos exigem que as metas alcancem também os emergentes. É esta a posição da União Europeia, que sinalizou positivamente para o novo período do protocolo contanto que os países em desenvolvimento ?façam mais pelo acordo?.
 
O Brasil e o Reino Unido receberam no domingo a incumbência da presidência da cúpula para tentar desbloquear as negociações para renovar o Protocolo de Kioto. O Brasil apoia uma segunda fase do tratado, no qual se estabeleçam metas de redução de emissões entre 25% e 40% com relação aos níveis de emissões de 1990 até 2020, como recomenda o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC).
 
Mas as perspectivas de Cancun aprovar um acordo legalmente vinculante, que obrigue as nações a cumprir metas, são pequenas. Neste caso, seguirá valendo o Acordo de Copenhague, cujos compromissos voluntários dos países levariam a um aumento da temperatura do planeta de em média 3 a 4 graus, criando um cenário de catástrofe para milhões de pessoas.
 
Está claro que o voluntarismo dos países não trará as soluções necessárias ao planeta. Até porque a maioria deles aposta em mecanismos de mercado para controlar as emissões de gases. Mas a COP-16, ao que tudo indica, pretenderá fortalecer justamente estratégias que possibilitem às grandes empresas lucrar com a crise climática. O caminho pode ser o de um ?ajuste climático mercantilista?, com destaque às falsas soluções, como o mecanismo de mercado de carbono e a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação de Matas (REDD+).
 
Discute-se na COP-16, inclusive, a iniciativa de globalizar os programas REDD+, o que pode gerar consequências devastadoras para comunidades e povos indígenas. Trata-se de um mecanismo que, por um lado, premia os grandes desmatadores e, por outro, compra comunidades das florestas como pagamento por serviços ambientais de absorção de carbono em suas matas. Através desse programa, as matas serão validadas como geradoras de crédito de carbono, o que, se aprovado, coloca todas as florestas sob a mira dos especuladores. Será um banquete para o mercado. Se pagará pouquíssimo para as comunidades que vivem nessas áreas e se lucrará muitíssimo com a revenda desses ?direitos? de absorção de carbono a outras empresas. Assim, as empresas mais poluentes podem continuar sujando a atmosfera sob a justificativa de que as matas estão absorvendo suas emissões.
 
Outra polêmica da COP-16 é conseqüência da cúpula anterior, em Copenhague, onde Estados Unidos e outros países desenvolvidos insistiram em condicionar o financiamento aos países em desenvolvimento à sua aceitação às propostas que eles defendem. Bolívia e Equador, por exemplo, votaram contra os acordos de Copenhague e não receberam os financiamentos para redução de sua emissão de gazes de efeito estufa. Outros países em desenvolvimento certamente foram submetidos a pressões similares para apoiar esta proposta, que muda o princípio da convenção de que todos os países têm responsabilidades comuns, mas em escalas diferentes.
 
É para defender este princípio que cerca de 30 mil pessoas estão em Cancun acompanhando a COP-16. A sociedade civil pressiona para que as agendas se aproximem, mas as perspectivas de fato são mínimas. Os documentos da Conferência sequer levam em conta as propostas da ?Primeira Conferência Mundial dos Povos sobre Mudança Climática e Direitos da Mãe Terra?, que recolheu os projetos de mais de 35 mil delegados reunidos em abril passado na cidade de Cochabamba, na Bolívia.
 
Em paralelo, a pressão que países em desenvolvimento, que ocupam um lugar relevante no cenário global ? como o Brasil, a China e a Índia -, poderiam fazer acaba sendo limitada diante do modelo desenvolvimentista que eles próprios têm adotado. Há alguns dias, por exemplo, o Observatório do Clima, que reúne 36 entidades de defesa do meio ambiente no Brasil, divulgou um estudo que calculou o impacto da aprovação do novo Código Florestal brasileiro para as emissões de gás carbônico na atmosfera. Segundo o estudo, com os novos desmatamentos autorizados pelo Código, seriam emitidas até 25 bilhões de toneladas de gás carbônico, o que compromete o atendimento às metas de redução de emissão de gases do efeito estufa assumidas internacionalmente pelo Brasil.
 
Ou seja, senhoras e senhores Deputados, enquanto o planeta quer ampliar sua cobertura vegetal, há parlamentares desta Casa que defendem arduamente que o Brasil abra possibilidades legais para um maior desmatamento. É este o exemplo que queremos dar para o mundo? É este o nosso compromisso com as futuras gerações? Acredito que não.
 
Por isso, vamos trabalhar para frear as derrubadas de árvore em nosso país, cumprir as metas de redução de CO2 assumidas internacionalmente pelo Brasil e colocar o esforço da nossa diplomacia na busca de acordos globais que não deixem nas mãos do mercado a solução para a sobrevivência do planeta, e tampouco submetam os povos em desenvolvimento, mais uma vez, à lei dos mais fortes.
 
Muito obrigado.
 
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP
 
Fonte: www.ivanvalente.com.br
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