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“Próxima batalha” é contra funcionários públicos e seus sindicatos

[“Próxima batalha” é contra funcionários públicos e seus sindicatos]

Bernard Cassen – Le Monde Diplomatique


A revista The Economist é o lugar onde são expostas com maior radicalismo ? e também com talento ? as teses ultraneoliberais. É conhecida a grande influência que este semanário britânico exerce sobre as autoridades políticas, influência esta que vai muito além do mundo anglosaxão. O que The Economist preconiza transmite-se frequentemente para as políticas dos governos, em primeiro lugar na Europa. Por isso, é preciso levar muito a sério a capa da edição de 8 de janeiro passado e o conteúdo do informe especial: ?A próxima batalha. Rumo ao confronto com os sindicatos do setor público?.

 

A tese da revista é de uma simplicidade evangélica e pode ser resumida em três pontos: a) todos os Estados europeus enfrentam déficits públicos abismais; b) para reduzir o gasto público, é preciso reduzir os efetivos, os salários e os sistemas de pensões dos funcionários; c) os governos ganharão com maior facilidade a opinião pública incentivando a denúncia dos ?privilégios? (em especial a estabilidade no trabalho) dos ?acomodados? do setor público, que supostamente vivem a custa do conjunto dos contribuintes.

 

Em nenhum momento o informe recorda que os déficits públicos são em grande parte consequência das ajudas colossais aos bancos e outros responsáveis pela crise atual. Tampouco que estes déficits aumentaram devido aos presentes sob a forma de isenções fiscais outorgadas aos ricos. Nem sequer se deixa claro que, em troca de seu salário, os funcionários prestam serviços indispensáveis para o bom funcionamento da sociedade. Em particular os professores, atacados muito especialmente neste informe. O jornalista que escreveu um dos artigos deve estar muito desinformado sobre as reais condições de trabalho dos professores para ter coragem de escrever que ?65 anos deveria ser a idade mínima para que essa gente que passa a vida em uma sala de aula se aposente?.

 

The Economist festeja que vários governos europeus ? dois deles dirigidos por ?socialistas?, Grécia e Espanha ? tenham rebaixado os salários de seus funcionários e que, em toda a União Europeia haja ?reformas? ? seria mais justo falar de contrarreformas dos sistemas de pensões já realizadas ou em vias de realização.

 

Por ideologia, os liberais são hostis aos funcionários e demais assalariados do setor público. Em primeiro lugar porque privam o setor privado de novos espaços de lucro. Em segundo porque, protegidos por seu estatuto, podem ser socialmente mais combativos que seus companheiros do setor privado, até o ponto de que, às vezes, fazem greves ?por delegação? e representam os trabalhadores do setor privado que não podem fazê-las. Esta solidariedade é a que os governos querem destruir a todo custo para reduzir a capacidade de resistência das populações contra os planos de ajuste e de austeridade implementados em toda a Europa. Os déficits públicos constituem assim um pretexto inesperado para modificar as relações sociais conflitivas em detrimento do mundo do trabalho.

 

Defender os serviços públicos é defender o único patrimônio do qual dispõem as categorias mais pobres da população. A aposta na caça aos funcionários públicos e a seus sindicatos proposta por The Economist não é apenas financeira. É política ou ideológica.

Fonte: RSurgente
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